«queria tanto que alguém me amasse por alguma coisa, que escrevi»

sexta-feira, 22 de julho de 2011

pós

depois de um dia de praia, de um jantar cá em casa, ele no sofá, engolia seco, com os olhos de quem olha mas não vê, a televisão fazia barulho, para o momento parecer menos do tanto que no fundo era para os dois, cada um tinha a distância de duas semanas, e depois de tantos anos, de tantas esperas, de tantos encontros, de tanta saudade, sabíamos o peso de duas semanas. era gigante, era gigante depois do beijo matinal diário, da mão dada no autocarro, da toalha dividida na praia, dos casacos de inverno partilhados, da presença constante que nunca suportou o vazio do frio de uma cama de casal ocupada pela metade em tardes de setembro, em fins de dia de dezembro, pós-almoços de maio.
deixam-nos a sós, para que tenhamos um pouco mais de nós, mas o coração não pára, a cabeça não pára, o corpo não reage. não é medo de perder, é medo da dor, medo da espera, dos dias que demoram meses, dos kms que se tornam muito mais longes. em poucos minutos descemos, o carro está quase a chegar, para leva-lo, diz-me para não chorar, mas a sua expressão facial não engana, não quer que chore, para não chorar. num beijo rápido, entra, naquele carro com as pessoas que fizeram o amor da minha vida, e a elas agradeci pelo feito. desejam boa viagem, ele no banco de trás engole seco, controlado. e arrancam. em segundos o homem da minha vida desapareceu no virar daquela esquina.
corro para a casa da pipa, cheia de vontade de chorar, e com um sorriso forçado, e uma gargalhada que nunca morre naquela casa, despeço-me. fácil.
em casa a mala já estava feita. choro, de saudades antecipadas, choro de uma outra coisa qualquer, que só quem ama sabe, o que é ter de ir embora, e deixar ficar.
de madrugada o telemóvel treme, é ele, com um testamento, com palavras que guardo, que ficarão para sempre, num capitulo qualquer de um livro meu qualquer.
ás 9h o avião arranca, a TAP diz a hora estimada de voo, a temperatura, e a pior frase 'dentro de momentos iremos iniciar a nossa viagem em direcção a praga' e aí. aí tudo fica num passado que queremos fazer de nosso presente, num passado que nos parece tão longe do futuro, de algo que nos pertence, nos completa, como nada nem ninguém. - incrível como tanta gente não acredita nisso, mas é verdade, é mesmo.
uma cidade linda, o meu irmão á espera, uma língua estranha, uma casa diferente. mas naquelas duas semanas ele não saí, não saí da cabeça. uma espera inquieta, que desmotiva, que cansa, que desanima, que nunca acaba, um mail enviado, um mail que não chega, uma mensagem vista fora de tempo. parece que todos os pedacinhos doem ali, ou pelo menos nos momentos mortos do dia doíam, ou quando cada casal insistia em passar na meu ângulo de visão na rua. dentro dos metros que enunciam a chegada com o vento frio no rosto, antes mesmo no alcance do olhar, e que partem antes mesmo de dar tempo de sentar.
os dias são assim. os dias com falta, são assim, dão voltas e voltas, e acabam no mesmo. mas lá passar passam, ou melhor, arrastam-se, numa lentidão de 87909 horas que parece ter cada dia.
chego, sempre com preguiça de desfazer as malas - então elas que fiquem feitas, no chão do quarto, tiro apenas a roupa suja. sempre curiosa, para ver, saber, estar.
e ele chega também, ali, do outro lado da estrada, a falar comigo ao telemóvel, a adiantar o passo, a chegar perto, a abraçar, a beijar ainda na estrada, a subir as escadas ao meu lado, a tocar-me, doidos, cheios de saudade, desejo e amor. deitado na minha cama como sempre faz, a falar, a olhar-me, a ouvir-me. a fazer-nos acreditar sempre mais em nós, longe de matar as saudades todas, que vão sempre existir acumuladas, durante horas, e eu, sempre curiosa, para ver, saber, estar, e eu ali, no meio dos braços dele, que são a melhor casa, e o melhor país que conheço e tenho, para ver que não mudou nada. que quando estivéssemos no centro comercial ele iria olhar para a montra, não para ver a roupa, mas o seu reflexo, que ele, seria sempre ele, o meu, o meu joão, o meu amor, o homem da minha vida.
e com todas as certezas do mundo, pós-horas-de-conforto-de-amor-pós-viagem, este amor tem-nos como nada na vida já nos teve.
amo-o.